Por José Mauricio Guimarães
As pessoas adstritas ao simbolismo ou pouco
versadas na simbologia debocham e riem do Reverendo James Anderson
(1680-1739) atribuindo a ele a frase: "Adão foi o primeiro maçom, iniciado
por Deus no paraíso". Se verificarmos o texto original de "The
Constitution of The Fraternity of Accepted Free Masons" (Constituições de
Anderson, 1723) veremos que Anderson escreveu o seguinte: "Adão, nosso
primeiro Antepassado (first Parent), criado a partir da Imagem de Deus, o
Grande Arquiteto do Universo, deve ter tido as Ciências Liberais, especialmente
a Geometria, escritas em seu Coração (written on his Heart) pois mesmo
desde a Queda, encontramos os Princípios dela nos Corações de seus descendentes
e que nos processo do tempo (in process of time), têm sido depuradas em
um conveniente Método de Proposições, pela observação das Leis das
Proporções..."
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Partamos do princípio de que as ordens
iniciáticas têm por objetivo despertar o potencial interior do ser humano e
auxiliá-lo na redescoberta de sua relação com o Cosmos. Consideremos que cada
pessoa seja portadora dos arquétipos que promovem sua evolução - arquétipos e
leis escritos em seu Coração. Nada há de cômico ou risível na afirmação
simbólica do Dr. James Anderson. Pelo contrário: é trágica a perspectiva de que
o homem seja um vazio destituído de qualquer base sobre a qual possa sustentar
seu templo interior. As etapas para se alcançar o conhecimento partem daquilo
que vem antes ("a priori", em latim) e são, no caso da afirmação de James
Anderson, uma anterioridade lógica sustentada nas noções de: 1) um Mestre
primordial (Deus ou Imagem [representação] de Deus); 2) uma
transmissão de potencialidades básicas (iniciação); 3) um recipiendário
(Adão ou, se preferirem, nossos primeiros pais - first parent); 4)
uma escola (templum - paraíso) preparado para aquele remoto
cerimonial. Quem estuda SIMBOLOGIA reconhece na afirmação do Dr. James Anderson
os quatro pontos necessários para a comunicação de um pensamento sob forma
figurada - uma ciência livre (liberal science) em especial as
justas e perfeitas proporções (Geometria) gravadas em seu íntimo (Coração). O
Adão a que Anderson se refere é o admah hebraico ou "criatura feita da
mãe-Terra". O Deus Iniciador é o (ainda) Desconhecido e Inefável. A
comunicação alegórica (iniciação no paraíso) deve ser compreendida mediante
vários aspectos: num primeiro estágio da inteligência, o objeto comunicado passa
pelas funções psíquicas da percepção e do julgamento: vejo isso; isso é bom
ou é mal! - alegoria da árvore do conhecimento do bem e do mal. No segundo
estágio, mais evoluído, ocorre a decomposição do objeto através da razão - o
que é isso? como é isso? No terceiro, há uma transcendência, pela
contemplação e pela iluminação, daquilo que foi comunicado - é o daqui para
onde. Se não conseguimos conceber o conhecimento primordial, a forma de
transmissão havida "a priori" (tempo) e uma objetividade factual
(espaço) é porque estamos formal e prematuramente iniciados. Se não temos
a percepção, o julgamento e o raciocínio superior, não podemos contemplar em
conformidade com os três estágios mencionados. O despertar daquele potencial
interior torna-se impossível e o reencontro do homem com o transpessoal, uma
utopia.
É verdade que convivemos com pessoas que,
apesar de terem recebido a iniciação apenas formal, negam os princípios da
transmissão primordial. Por causa disso o formalismo e o ritualismo tendem a
suplantar o conteúdo filosófico nas Ordens e nas Lojas que as compõem. Por outro
lado, é justamente nessa relação entre o Mestre primordial
(D'us) e o recipiendário inocente (adão/adam/adamah)
que reside a tradição judaica, os cânones da cabala e sua relação mais íntima
com as iniciações (especialmente a maçônica). Vou além: mesmos as religiões -
monoteístas ou politeístas – partem de princípios idênticos ao
Bereshit hebraico seguido do Adam Kadmon - homem
arquetípico ou anthropos - elementos cuja verdadeira compreensão e
realização determinam o nível de evolução alcançado pelo discípulo, pelo
aprendiz e pelos que almejam a maestria. Religiosos ou não, mesmo os mais
radicais, céticos e materialistas admitem um process of time -
processo do tempo nas palavras de Anderson, que equivale aos enunciados da
evolução. Quando o Dr. James Anderson sugeriu que Adão fora o primeiro
maçom, iniciado por Deus no paraíso, ele quis expressar a seguinte verdade: o
homem traz dentro de si (written on his Heart) as ferramentas necessárias
para construir uma relação harmoniosa com seus semelhantes
(templo-outro), com o templo-planeta e
o templo-universo. Todo aquele que bate nos portais da
Iniciação é um Adão (Adamah) que retoma um lugar entre nós,
na oficina do Cosmos, dispondo-se a utilizar os instrumentos de trabalho -
"especialmente a Geometria", diz Anderson referindo-se alegoricamente à
Moral das justas e perfeitas proporções entre o homem e seu
meio.
Um comentário:
>> É uma pena que muitos iniciados não conseguem perceber os mistérios contidos em nossos rituais e como resultado disso, temos a formação de Mestres apenas em suas insígnias, é uma bela peça para reflexão!
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