quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

A Tolerância Maçónica


José Ortega y Gasset dizia que desconfiava do respeito de um homem para com o seu amigo ou para com a sua bandeira quando o mesmo não era capaz de respeitar o seu inimigo ou a bandeira deste.

O respeito pelo próximo (ainda que o próximo esteja tão distante que o consideremos nosso inimigo), é a "substância" de um valor que nós Maçons muito prezamos, o da Tolerância.

Noutra perspectiva, Fernando Teixeira, 1.º Grão Mestre da GLRP, dizia que a Tolerância acaba onde começa a estupidez.

As opiniões de Ortega y Gasset e de Fernando Teixeira são aparentemente contraditórias, desde logo porque respeitar o inimigo e a sua bandeira, para a maioria das pessoas, seria só por si um acto de estupidez.

Mas, ultrapassado que esteja este primeiro nível de abordagem, a aparente incompatibilidade das duas posições aumenta dado que Ortega y Gasset sugere o respeito ao outro mesmo que nos queira mal e Fernando Teixeira parece excluir do âmbito da Tolerância a estupidez, ainda que o estúpido nos queira bem.

Se mesmo em cenário de guerra deve ser respeitada a dignidade de um inimigo, capaz de nos tirar a vida, será que esse mesmo dever cessará perante o estúpido que não sabe o que diz, de tal modo que o possamos desrespeitar?

Parece-me óbvio que não.

O respeito pelo próximo é, na sua expressão mais básica, um dever de respeito pela diferença.

É a inevitável circunstância de todos sermos diferentes e o correspondente direito de o sermos que nos faz iguais. Nas diferenças de cada um reside a sua identidade. Eliminar o direito à diferença seria eliminar o direito à identidade.

O trabalho do Iniciado deve partir desse respeito pelos outros e pelo direito à diferença de opinião. Se há algum julgamento a fazer é o do iniciado a si próprio, de acordo com a máxima "conhece-te a ti mesmo" (adoptada por Sócrates e cuja autoria se atribui a Tales de Mileto).

A Tolerância, porque se trata de um dever e valor da Maçonaria, apenas incide sobre os que, fazendo parte da Ordem Maçónica, praticam a Arte, i.e., os Maçons.

O Maçon pauta a sua conduta por princípios maçónicos, não em função da conduta dos outros. A sua actuação é causal e não um mero efeito; é acção e não reacção.

Nisto consiste "o exemplo activo do seu comportamento viril, digno e são" e "a arte de conservar em todas as circunstâncias a calma e o equilíbrio indispensáveis a um perfeito controlo de si próprio" (11.º e 12.º Landmarks).

Tal como o cubo é cúbico, a conduta do Maçon deve ser maçónica. Quaisquer limites aos princípios e valores maçónicos dizem apenas respeito ao próprio Maçon.

Nestes termos, o limite da Tolerância a que se referia Fernando Teixeira não é o da estupidez dos outros mas, antes, o da estupidez em que incorre o próprio Maçon se tudo tolerar.

O Maçon, perante a estupidez alheia, não deve responder à letra a quem não está em condições de controlar o que lhe passa pelo espírito. Quaisquer que sejam os limites da Tolerância - e outros há como o fanatismo, a tirania, a ignorância, etc... - eles não consentem ao Maçon margem para ele próprio actuar como um fanático, um ignorante ou um tirano ...

Se ao fim de algumas tentativas não conseguirmos abrir uma porta porque a chave não se adequa à fechadura, o melhor será mudarmos de chave.

Pouco inteligente seria insistir na mesma chave ou, por exemplo, optar por pontapear e insultar a porta. Para além de não resolvermos o problema, seríamos tão ou mais estúpidos do que a própria porta.

O Maçon busca a Virtude sem necessidade de humilhar alguém.

Por isso, perante a estupidez alheia, ao Maçon bastará mudar. Ou de conversa ou de interlocutor ...

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